Quando a Perícia Fere: a Urgência de Expurgar o Formalismo da Justiça Previdenciária sob o Prisma do In Dubio Pro Misero
- Lucas Rezende
- 17 de jul.
- 2 min de leitura
Atualizado: 7 de ago.
Por Lucas Eduardo Barbosa Rezende, Advogado

Hoje escrevo tomado por indignação.
Minha cliente, uma mulher agricultora em evidente situação de vulnerabilidade social, convive com fibromialgia e outras comorbidades crônicas que lhe causam dores físicas viscerais e limitações funcionais severas. Mesmo diante deste cenário de sofrimento contínuo, seu pedido de afastamento do labor rural foi indeferido.
O motivo? Um laudo pericial judicial precário concluiu, de maneira absolutamente descolada da realidade, que ela está apta a seguir trabalhando normalmente no campo.
Segundo o Sr. Perito, essa mulher pode tranquilamente continuar suas atividades sob sol intenso, realizando esforço físico repetitivo, carregando peso e submetendo-se à sobrecarga biomecânica do labor rural braçal, como se estivesse em plena saúde física e emocional.
Essa não é uma conclusão técnica. É uma forma de crueldade legitimada pelo sistema.
Diante desse cenário revoltante, levei o caso à Turma Nacional de Uniformização (TNU) com uma tese jurídica autoral, construída a partir de intenso estudo e fundamentada no artigo 139, inciso IX do Código de Processo Civil e na Resolução CNJ nº 233 de 2016.
Eis a proposta:
A perícia médica previdenciária deve observar os princípios da verdade material, da dignidade da pessoa humana e da proteção à parte hipossuficiente. Quando restar demonstrado que o perito atua reiteradamente com insensibilidade social, desatualização técnica ou omissão de dados relevantes, cabe ao Poder Judiciário desconsiderar o laudo, determinar nova perícia e avaliar a exclusão do profissional do cadastro oficial por ato atentatório à dignidade da justiça.
Não se trata de revanchismo. Trata-se de uma proposta de higiene institucional. A permanência de peritos que reiteradamente falham com a ética, a técnica e a empatia é um obstáculo à realização da justiça.
É urgente romper com a dependência cega de pareceres periciais automatizados, insensíveis e desumanizados. O Judiciário não pode ser refém da caneta do perito que despreza o sofrimento humano.
A jurisprudência do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1), que afirma que laudos médicos particulares não têm o condão de afastar o laudo oficial, tem blindado injustiças gritantes.
Isso não é hermenêutica. É a negação da dor como realidade jurídica legítima.
Se a repercussão geral for reconhecida na TNU, levarei essa tese ao Supremo Tribunal Federal (STF). E, se necessário, à Corte Interamericana de Direitos Humanos. Porque não há justiça social possível sem justiça pericial.
O serviço pericial precário prestado hoje no Brasil fere frontalmente o princípio constitucional da dignidade da pessoa humana.
Todos nós pagamos a Seguridade Social. É um pacto coletivo, previsto na Constituição. Negar esse direito àqueles que mais precisam, por causa de um laudo mal feito, é trair esse pacto.
O Direito Previdenciário não pode mais ser interpretado sem o filtro do princípio do in dubio pro misero. Se não colocarmos o sofrimento humano no centro da análise jurídica, o Direito deixará de alcançar os vulneráveis e hipervulneráveis, justamente aqueles que ele se propõe a proteger.
É hora de reagir. Sigamos.
Lucas Eduardo Barbosa Rezende, Advogado – Salvador/BA © 2025. Todos os direitos reservados.





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