Produtivos até que Quebremos: a Verdade Real da Advocacia no Brasil
- Lucas Rezende
- 7 de ago.
- 3 min de leitura

A advocacia está matando seus profissionais. E o sistema aplaude.
Essa frase pode parecer dura demais.
Mas se você é advogado ou advogada, talvez já tenha sentido isso na pele. O peso esmagador da responsabilidade. A insônia. A taquicardia antes de uma audiência. O medo constante de errar. A vergonha de admitir que não está bem.O colapso emocional tratado como rotina. O sofrimento silenciado com pose de competência.
Há algo profundamente doente na forma como o Direito tem sido praticado. E mais ainda, na forma como fomos ensinados a aceitá-lo.
Eu adoeci. E não foi por fraqueza.
Sou advogado. Tenho depressão e síndrome do pânico.
Falo isso sem constrangimento, mas com a consciência de que, por muito tempo, me senti culpado por não aguentar o peso que todos ao meu redor pareciam carregar com naturalidade.
Foram meses, ou melhor, anos fingindo que estava tudo bem. Tentando manter a performance. Entregando resultados enquanto desmoronava por dentro.
Não foi falta de vocação. Nem fraqueza. Foi excesso. Excesso de tudo. De cobrança. De carga. De silêncio.
A farsa da nobreza
Desde a faculdade nos vendem um mito. O do advogado imbatível, incansável, estrategista, herói.
Mas o que não te contam é que, na vida real, esse herói chora escondido no banheiro entre uma petição e uma ligação de cliente.Não dorme direito há semanas. Toma ansiolítico para aguentar o expediente. E se culpa por sentir tudo isso.
Porque aqui, sofrer virou requisito. Adoecer virou mérito.
Você é medido por quantas horas suporta sem parar. Por quantos processos consegue tocar sem colapsar.Se está em paz, talvez esteja pouco engajado. Se diz "não aguento mais", é fraco. Descartável.
A advocacia virou um moedor de carne de luxo. Com crachás personalizados e linguagem técnica para disfarçar o massacre.
O que ninguém quer dizer
Ninguém quer admitir, mas já virou regra.Jornadas de 12, 14, 16 horas como rotina.Clientes invadindo finais de semana como se fossem donos do seu corpo.Escritórios tratando burnout como frescura.Advogados públicos com mais processos do que é humanamente possível analisar.Jovens destruindo a saúde mental antes dos 30 para não perder o emprego.
E tudo isso regado a um discurso perverso."É assim mesmo. Faz parte. Quem quer lugar ao sol, tem que pagar o preço."
Só não te avisam que esse preço, muitas vezes, é sua sanidade. Sua saúde. Sua vida.
A farsa do autocuidado
É claro que autocuidado é importante. Terapia, meditação, boa alimentação.Mas não existe mindfulness que cure um ambiente tóxico.Não existe respiração consciente que compense 300 prazos por semana.
Não adianta mandar o advogado fazer ioga se o escritório continua funcionando como uma máquina de esgotamento.
Não adianta falar em equilíbrio se ninguém pode tirar férias sem culpa.Não adianta campanha de Setembro Amarelo se, na prática, quem desaba é tratado como problema.
A saúde mental não é um luxo. É sobrevivência.
Falar sobre saúde mental na advocacia não é mimimi. Nem pauta identitária. É uma questão de sobrevivência.
Porque não se trata só de bem-estar. Trata-se de manter vivo quem carrega a responsabilidade de defender direitos, garantir Justiça, proteger vidas.
E se a advocacia adoece, a Justiça também adoece.
Romper com esse ciclo é urgente
Não existe dignidade profissional onde o sofrimento é naturalizado.Não existe vocação que sobreviva à violência institucional disfarçada de excelência.
Precisamos romper com esse ciclo doentio.
Precisamos escrutinar escritórios que tratam gente como número.Precisamos exigir políticas reais de bem-estar psicológico.Precisamos reduzir metas inatingíveis.Precisamos dar nome ao que está nos matando. Violência organizacional.
E acima de tudo, precisamos escutar e acolher quem grita em silêncio há anos.
Se você está esgotado, não é você que está fraco. É o sistema que está podre.
Se você chora depois do expediente, se tem medo de dizer "não aguento", se já pensou em desistir, não é fraqueza.É sobrecarga. É abuso. É adoecimento legitimado por uma cultura doente.
Você não está sozinho. E não precisa aceitar esse modelo como destino.
A advocacia pode ser diferente. Mas precisa parar de fingir que está tudo bem.
Não basta falar em saúde mental.É preciso derrubar o pacto de silêncio que protege o adoecimento como se fosse identidade profissional.
Advogar não pode ser sinônimo de se anular. De se mutilar emocionalmente em nome de metas, status e reconhecimento vazio.
A advocacia precisa voltar a ser um espaço de humanidade. Não de exaustão crônica.
Ou a profissão se reconstrói, ou continuará triturando vidas atrás de resultados.
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